quarta-feira, novembro 07, 2012

coisa qual quero (de beto e caetano vianna)



quase o pensamento que me ganha
de penso em penso
de transe em transe
quedo-me arranhando uns desenganos
dou trela à toa
de vez em quando
- surto!
mudo de rumo pra lá da manhã
e lá, e lá, e lá, e lá, e
sem medo, sem medo, sem me... hem?
durmo um barulho da cor do sol
segredo, o segredo, é fazer bem
morrer, feliz, comigo e é...
o gesto é tudo, é tudo, é tu... quase
quase o pensamento que me ganha
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segunda-feira, outubro 15, 2012

here somes the sol



a noite chega e o gelo corta
e a noite dura e o sangue gela
a noite prolonga a dor fria
a noite, noite, o frio da noite

o sol desponta e corta o gelo
e o sol é cedo e esquenta o sangue
quente o medo que o sol se vá
o sol, sol, o medo do sol

o ciclo vivo quer o amor
pro triste e o prazer receber
o frio e o quente passarão
pro sol se pôr e a noite vir

outro sol e de noite outra vez
manhã de domingo do amar

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quinta-feira, outubro 04, 2012

reparação


é noite. a boca seca bebe d’água louca. o gosto amargo cospe o trago curto. miradas turvas trocam o entra e o sai. metade olham, o outro meio, não. é dia. a mão resfria à garra do amor fogo. o toque em ouro faz-se tudo engano.  miradas dúbias dizem que o sol sai. metade cegas da terrível luz. é tarde. sorrir no escuro azulbrilhar da noite. chorar no claro enrubescer da aurora. ajuntar bocas, afagar as mãos. é um antes de ontem, é um era sem fim

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terça-feira, setembro 25, 2012

beaguá


ah! ê, my cidade molhada
hum! ô, liquidade natal
habito-me boiando em ti
por em minha bela horizontal

oh! lonjura de ruas rios
ay! secura de barros lejos
retraz minha cidade aqui, fera
refaz volitivos meus erros

inunda imunda os pensamentos
que já não mais posso pensar
no mar, no mar, no mar, no mar
la mar, la mar, la mar, la mar

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domingo, setembro 16, 2012

paixão e amor


paixão é como é a ira
loucura curta duração
se alonga, e vira, a pira
ção... são... ção

paixão é de momento
se ardia, arde e ardeu
paixão é esse momento
porentre o meu e o seu

amor é que é pra sempre
se arde, ardeu, ardia
amor é o ser pra frente
bão nosso a cada dia

meu coração tem um pedaço
com o justo formato de ocê
meu coração tem um espaço
conforme estar vago procê

tira pedaço a paixão
e sobra um buraco no meio
preenche o espaço o amor
de ateu, agora, eu creio

paixão é pra muitos
o amor é pra poucos
o amor quer nós juntos
paixão quer nós loucos

paixão faz-me descer
ao inferno e à dor de dar
o amor me faz crescer
sem ver-te e a te esperar

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terça-feira, setembro 11, 2012

Tempura


Um segundo, dois,
dois segundos, três.
Quatro segundos.
E um.

Um minuto, dois,
dois minutos, três.
Quatro minutos.
E um.

Uma hora, duas,
duas horas, três.
São quatro horas.
E uma.

Passa um dia, dois,
São dois dias, três.
Quatro são os dias.
E um.

Passa um mês, dois,
Dois meses, três.
Quatro são os meses.
E um.

Passa um ano, dois,
são três anos, quatro,
Quarenta anos.
E.
Hum.
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sábado, setembro 08, 2012

Ô dó


Sei o seu. sei.
meio meu.
may I?
tenho o teu.  tá?
feio fiz. full
time?

Quanto quarrel não sei
como queimei no mei
chame chuva e o chapéu
shall
I?

Já joguei, já girei, já gerou
Já juntei
e já?

Por que partes perfeitamente plena em pé?
será se sou eu sonhando ou se é só o seu que é
sou só?
seja eu só?

Então entre e antes durante e cante atroz
cantigas antigas do front de anti-nós
e então eu farei pra sempre em vós
um tanto quanto – sem voz
um tanto menos – pior
o quanto eu tento – ser nós
eu fora e ocê dentro
e é.
ou não.
ô-dó.

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quinta-feira, setembro 06, 2012

Modais de quatro a quatro



Querer viver,
Podendo amar,
Eu devo a ti.

Quero a ti amar?
Devia a ti ser,
Mas não posso a ti.

Devo viver o amor?
Eu quero o amor viver,
Só não pode esse amor.

Eu posso viver sem ti?
Não quero viver sem ti,
Mas devo sem ti viver.

Mas devo viver sem te amar?
Eu quero viver sem te amar.
Viver sem te amar eu não posso.

Viver sem te amar eu não posso?
Se quero viver sem te amar,
Não devo viver sem te amar.

Eu posso viver sem ti?
Não quero viver sem ti,
Mas devo sem ti viver.

Devo viver o amor?
Eu quero o amor viver,
Só não pode esse amor.

Quero a ti amar?
Devia a ti ser,
Só não posso a ti.

Querer viver,
Podendo amar,
Eu devo a ti.

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sexta-feira, agosto 31, 2012

reamaria





como eu não sei rezar
vou ficar ao meu lado
eu cuidando de mim
sentado ao meu lado de deus

como eu não sei rezar
vou ficar ao seu lado
só: pensando em você
cercado de sonhos ateus

bom amar de com força
força de amar de leve
até que o amar me leve
pro objeto direto  do amor

bem amado de novo
renovadamação
até que o tao reúna
pro bem no meio do amor

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segunda-feira, agosto 27, 2012

Outros anjos


“Eu quero” num é frase, querer é língua morta
Não se quer só quase, quase querer não importa
Quase pra tudo um anjo teu
Não é pra ti nenhum arranjo

Dizes tu douta e direito
Com a mesma língua de outrora
Que o fazer é o ser correto
Que o dizer é o ver pra crer

Queres querer ser feliz
Ao meio do curso mudar
O voo do anjo que quis

E quando o doce da amora
Torna azedo o teu querer

E quando o vento de agora
Sopra contra o meu fazer

Tu fazes com outros anjos
O que o meu dizer não fez


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quarta-feira, agosto 22, 2012

adora


a dor tem vida própria,
não faz parte da gente:
a dor é uma coisa, a gente é outra.
a dor tem luz própria,
não faz parte da manhã:
a dor é uma coisa, a manhã é outra.
a dor é inconformista,
não tem modos nem forma:
a dor é uma coisa, a forma é outra.
a dor é escapista,
não tem como a prender:
ou bem se dói,
ou bem, se der.
a dor é independente,
não se doma ou se sente:
a dor é uma coisa
e essa coisa é a outra.
a dor é involuntariosa,
não adora a ninguém:
a dor não sabe, a dor não quer,
a dor é essa mesma mulher.
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quinta-feira, agosto 02, 2012

Genetanatologia


O universo evadiu-se a si mesmo
de matérias trevas,
de luz e de chão.
Caos, Gaia, Eros, Éter e Nix:
de que deuses são feitos meus tiques?
Quarques up, strange, bottom and down:
que sabores compõe o meu mix?
A vida surgiu aqui uma vez,
ou duas, ou três,
ou mais de um milhão.
Resta dessas vidas só uma filha,
toda vida então.
Os extraterrestres que chegam,
sedentos à Terra,
não se sabe se são amigos,
ou senão.
O amor, quando o amor acaba,
é invasão.
Já o inverso,
pois não.

quarta-feira, julho 25, 2012

Reinata


Não há nada como as asas
Não há asas
Não há jeito de o ciúme, como as asas
Suspenderem a nós todos
Dessas bases, e deixarem
Nós à míngua, como um nada,
E elevarem, às mais altas
Dores nossas
Repetirem o que é os casos mais sensíveis
E vulgares
E tenazes
E quase os lugares que aprazem ficarem
Em nós.

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sábado, julho 14, 2012

Céu pretos




Que é a vida convivida?
Eu ainda não provei.
Eu ainda não sei o que é ser, com outro ser,
o dou, o sobrar e o sabor.

O que é a saudade, se ela só se rola e enrola
como um canivete de mola,
de que se sente o fio frio logo a navalha é aberta,
e guardada nem fere, nem toca, nem corta?

De que vale amar o amar demais do mesmo?
De que serve a cisma, o firme, o vício?
De quantos paus dispor preciso
dos quais meu um é a encolhida fonte?  

Quantos dias preciso entregar
ao futuro que os dias por vir me deve?
Quantas noites o sorriso me há de roubar
a verdade alegre que a boca não quer
não pode
nem deve
me contar?

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segunda-feira, julho 02, 2012

ir metismo aliciante



amanhã decidi mudar tudo

troquei de:

“nunca imagine que você mesma não é outra coisa senão o que poderia parecer a outros do que o que você fosse ou poderia ter sido não fosse senão o que você tivesse sido teria parecido a eles ser de outra maneira”

como disse a duquesa de alice,

por:

deixar-me atirar
de bruços
por sobre as paragens viadas
da mudanciolândia.

(a função ir mética da poesia pede que não se lhe interrogue um a. a poesia assim posta é deveras útil em tempos de guerra, em que a balbúrdia da mensagem decifrada nada deve à cifra original, e igualmente precisa em contextos de amantes proibidos, que tanto mais se amam escondidos quanto mais o amor desavergonhadamente é muito ou perdura)

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sábado, junho 23, 2012

água d'gota


“quero ficar com você
mas nem tanto
quero te ver outra vez
mas num canto
quero ser tua de vez
mas tem pranto
quero pra sempre o seu ser
desencanto”

a palavra dita, a promessa feita,
doi de não resvalar
o amor pregado, o bom anunciado
doi de não encaixar

quero ficar comigo
mas nem tanto
quero me ver outra vez
mas num canto
quero ser meu de vez
mas tem pranto
quero pra sempre o meu ser
desencanto


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quinta-feira, junho 07, 2012

jealous guy




todo sentido é a pé
e o que nos vale é a maré
ofegante em fluxo eu vou
ofegante em fluxo eu vou

ainda é o sim se errou
ainda é o sol se a chuva cai
ainda assim se erramos
o mundo vem e vai

se a loucura já secou
e há um mar em vez do amor
vem de dentro essa vontade
vem de dentro essa vontade

ainda é o sim se errou
ainda é o sol se a chuva cai
ainda assim se erramos
o mundo  vem e vai

não querer não cabe mais
apesar do peso é a paz
esperar que a lua vem
esperar que a lua vem

ainda é o sim se errou
ainda é o sol se a chuva cai
ainda assim se erramos
o mundo vem e vai

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sábado, maio 26, 2012

quando eu lhe pedi ajuda



quando eu lhe pedi ajuda
pra são josé da ajuda me ajudar
pra gozar com você dos campos
pra estar com você em qualquer lugar
quando eu lhe pedi procê me ajudar
preu ficar até ficar utá ficar itájudar
quando eu lhe pedi
pra juntar
o nós em nós dois
(dê-me o leitor a licença da ausência de rima: ela não quer a baixa estima)
você disse que não
você disse que não era isso o que eu era
você disse que eu não me metesse em quisesse
gozasse em quimera.
você disse-se.
e desdisse-me nós.
e  agora você
a ajuda que eu não nem preciso oferece
a ajuda esmolenta que compra o meu sim
e quer que num sim nos apague a frieza
e quer que (agora retorna a a rima)
eu ria com a sina de ser infeliz
ganhando a esmola
que fode o meu quis       

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sábado, maio 19, 2012

o tao da poesia


o maior barro de que se enlama a poesia
é o poeta que antes de mim já dizia
é a poesia passada em lembrar doutro dia
é o vendaval de retornadas alegrias
um pedaço de terra afastado de mim
um refúgio pro amor ser mais longe de mim
um som drummond de araque zombando de mim
dizendo tal qual já não se houvera redito
dizendo o caos adiante tal fosse infinito
dizendo o mal que só agora eu acredito
e, se é assim: fuck:
que bem no meio do caminho there was a rock
que tinha uma pedra bem no meio do caminho
que o tal (caminho do meio) era feito pedra
...
já é o corpo triste prostrado antes da estrada
já é o vento longo de angústia apresentada
já é a prévia do embora no fim da embolada
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terça-feira, maio 08, 2012

dizer, desbravar, dizer



a floresta mais densa não resume a frustração hirsuta
que é o se meter inútil a desbravar impune a poesia
tormentoso trabalho, esquivo produto de suor ou inspirada magia
inútil esperançar se se poeta esperando que a poesia diga
do amor e a alegria, da perda, do alento e a fadiga.
no fim dos cantos, poetar nenhum desse mundo diz
poetar nenhum desse mundo termina, afinal,
em final triste ou feliz:
o dito só entorna de volta.

tirar “tristes redes a tus ojos oceánicos – diz neruda
fatigar “sin rumbo los confines" – diz borges
“de esa alta y honda biblioteca ciega” – dicen los dos.

a poesia mais densa não resume a frustração hirsuta
que é o se meter inútil a desbravar impune a floresta
tormentosa aventura, esquiva clareira de um sol a escorrer na testa
inútil avançar se se adentra a floresta esperando vencer a fadiga
de amor e de dor, e de perda e de alento e de amiga.
lá pelas tantas, esperança nenhuma desse mundo quer
floresta nenhuma desse mundo se abre, afinal,
ensolarada clareira:
o denso só adentra de volta

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